quinta-feira, 10 de abril de 2014


Escrevi este poema em 2007, e ele saiu tão natural como o suor. Depois de 2 anos e meio sendo obrigado a escrever um texto inútil para uma (de)preciação crítica igualmente inútil, finalmente eu estava limpando meu corpo das toxinas do meio acadêmico... rsrs...

UNIVERSIDADE FEDERAL

primeiro
eles amarraram
o poema
na mesa de cirurgia
e o drogaram
e o intoxicaram
durante semanas
com toda forma conhecida
até o momento
de artigos ensaios teses e dissertações

eles se dedicaram
eles realmente se esforçaram para anestesiar
as simples e naturais
capacidades expressivas do poema

depois
seguindo o procedimento padrão
eles tentaram retirar cada um dos seus órgãos
isolaram verso a verso as veias
artérias aurículas e ventrículos
enfim todo o sistema vascular e circulatório
do poema

mas mesmo assim
os órgãos continuaram pulsando
separadamente

para surpresa e desgosto de todos os doutores
em literatura presentes
os órgãos internos
do poema
apresentavam
de forma insuportavelmente musical
e intoleravelmente ritmada
a mesma arritmia lírica
que o autor havia denunciado
em muitos momentos simples espontâneos
e aparentemente sem significância
de sua biografia

como isso era possível?

eles simplesmente não compreendiam
como aquele poema
sem rigor científico algum
depois de completamente
e meticulosamente esquartejado
poderia ainda estar
vivo

o que eles fizeram então?

eles isolaram a área
lacraram as portas
cimentaram as janelas
queimaram todas as evidências
distribuíram cianureto para todos os envolvidos
pois não poderia haver registro
ou testemunho futuro
que comprovasse uma falha assim

um fracasso como esse
poderia muito bem comprometer
seus currículos lattes para sempre
e arruinar suas carreiras na universidade

depois disso
os poucos que restaram
após semanas e semanas
de muitas mesas de discussão
de literatura
chegaram à seguinte conclusão
lida em ata pelo mediador
ao final da sessão:

– visto que ele não pode mais ser apanhado
e que os seus poemas
não quiseram colaborar conosco,
teremos que pôr em prática
o plano B...

algum dos ilustres doutores
que acompanharam o caso Koproski...
por acaso sabe onde mora
a sua musa?

Fernando Koproski
do livro “Retrato do artista quando primavera” (7letras, 2014)

os livros também estão disponíveis na Livraria Arte e letra (Al. Presidente Taunay, 130, Batel, Curitiba)

ou pela site da editora 7letras:
https://www.7letras.com.br/catalogsearch/result/?q=fernando+koproski


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