segunda-feira, 27 de junho de 2016

Medo e delírio em Curitiba

Trocando em Miúdos: Após vinte anos de poesia, Fernando Koproski lança trilogia ficcional e quebra gêneros literários.

Por Jonatan Silva – A Escotilha
29/04/2016
Como Bukowski, um de seus heróis, Koproski é apaixonado por gatos. Foto: Ingrid Schulze / Divulgação.

Quando poeta/cantor/compositor canadense Leonard Cohen publicou seu primeiro romance – A Brincadeira Favorita –, em 1963, após dois livros de poesia, declarou que aquela era a sua melhor melodia. A impressão deixada pelo debut em prosa do curitibano Fernando Koproski, depois de duas décadas de versos, não é muito diferente. Misturando cinema e literatura ao reflexo que vê de sua própria cidade, o escritor cria na trilogia A Complicada Beleza, um bota-fora dos poemas confessionais e autobiográficos que o acompanharam até agora.

O livro que inicia a trinca, Narciso Para Matar (7Letras, 104 págs.), faz um drible no leitor desde o seu título – uma referência ao clássico de Kubrick – ao criar um jogo de espelhos entre o autor e o narrador. Narciso é um personagem dentro de um livro escrito pelo Narrador, que é também um personagem de Koproski, que termina por virar uma criatura de si mesmo. Ao mesmo tempo o romance se transforma em um thriller, em que Narciso precisa vingar a morte da sua amada, Marina. Entre tantas artimanhas, a obra não se deixa levar por gêneros literários e transita entre a romance, a poesia, o conto. Para Koproski, não é preciso rótulos nos quais encaixar seus livros. “O trabalho criativo só tem a ganhar com a dissolução das fronteiras. Penso num poema tão aceso e livre quanto o sol dentro dos olhos do girassol. Por que fechar os ouvidos a isso? Até quando vamos amputar nossa percepção?”, definiu em entrevista exclusiva à A Escotilha (leia o bate-papo completo no final da resenha).

Ainda que caminhe livremente, a trilogia não perde uma característica fundamental de Koproski: a musa. Direta ou indiretamente, ela sempre está ali. Em Crônica de um Amor Morto (7Letras, 144 págs.) busca em Edgar Allan Poe (1809 – 1849) os elementos para a sua narrativa delirante. Como Hunter S. Thompson (1937 – 2005), o protagonista vive no limite entre o real e o abstrato. E novamente Curitiba é o cenário, mas agora com direito a uma passagem lisérgica pelo litoral paranaense. Ao contrário do livro anterior, Crônica de um amor morto é uma sucessão infindável de mulheres dizendo adeus: uma a uma elas abandonam o protagonista ou são abandonadas – ou simplesmente saem de cena no momento certo. É como se todas as mulheres fossem como a musa desconhecida de Charles Bukowski (1920 – 1994) no poema “de vez em quando”, traduzido pelo próprio Koproski, em Maldito Deus Arrancando Esses Poemas da Minha Cabeça: elas passam na rua e a paixa dura segundo, até a próxima esquina.
No final das contas, fica-se atordoado com o jogo de espelhos koproskiano. É impossível deixar passar incólume a trajetória de gente tão neurótica quanto os personagens de Koproski, ele próprio, eu e você.

Tudo acaba em A Teoria do Romance na Prática (7Letras, 137 págs.). Koproski mais uma vez destila suas referências cinematográfica – de David Lynch a Woody Allen – para construir uma história vertiginosa em que ele mesmo acaba morto. Desde a apresentação, que ficou a cargo de Alexandre França, o romance (se é que podemos chamá-lo assim) quebra a barreira entre realidade e ficção, autor e leitor, trazendo à tona a máxima de Foucault em quem lê também se torna responsável pela obra. A história gira em torno de duas pessoas, Felipe e Scarlett, mas nada impede que os mortos de outros livros regressem e se incorporem.

Aqui, muito pinhão

Koproski não se intimida por ser curitibano. Os três volumes da trilogia deixam isso claro logo nas capas – que usam imagens do fotógrafo Daniel Castellano – criando uma espécie de reconhecimento imediato. “A cidade é uma musa com cinto de castidade. Ela usa um cinto que ela mesma fechou e jogou fora a chave. E dependendo do humor em que ela se encontra, ela insinua, seduz e ilude. Você pode até achar que um dia será acolhido entre seus favores, às vezes pode até quase sentir suas carícias, mas nunca vai inaugurar o beijo ou mesmo consumar o ato”, esclarece.

No final das contas, fica-se atordoado com o jogo de espelhos koproskiano. É impossível deixar passar incólume a trajetória de gente tão neurótica quanto os personagens de Koproski, ele próprio, eu e você.

Leia na íntegra a entrevista com Fernando Koproski

A Escotilha: Depois de 20 anos de poesia, como a prosa entrou no seu trabalho?
Fernando Koproski:
 A prosa sempre esteve presente em minha literatura. Posso dizer que ela me alimentou tanto quanto a poesia, desde quando comecei a me interessar por livros e literatura. Acho que até nas preferências literárias a prosa sempre ocupou um espaço amplo, arejado e crescente, pois sou leitor de Joyce, Virginia Woolf, Clarice Lispector e diversos outros escritores que injetam poesia em suas narrativas, ampliando a significância de uma história. Já como autor, a atividade de contar histórias é algo mais recente. Diria que é uma imprudência recente que têm me dado um prazer diferente e desafiador.

No livro Crônica de um Amor Morto você diz que a poesia é o “suor da alma”. Essa é uma convicção pessoal ou meramente literária?
Não diria que é uma convicção. Convicções são senhoras chatas e tediosas que tendem a limitar qualquer ato criativo. Quando se trata de literatura, melhor seria não ter nenhuma convicção. E estar aberto às percepções. Nesse sentido o “suor da alma” seria mais uma percepção da natureza da escrita, e como qualquer percepção é derivada do momento e deste, também dependente, a fim de criar significação.

Quais as diferenças entre escrever poesia e narrativa?
Escrever poesia é algo fragmentário. Você escreve um poema um dia. Passa vários dias sem escrever. Depois escreve outro, que pode não ter relação nenhuma com o anterior. Ou seja, cada poema é um universo fechado em si, ilimitado dentro de suas limitações. Enfim, não prescinde de nada anterior ou posterior à sua existência. O poema é um universo autossuficiente, não depende de nada e de ninguém, muito menos do autor. Ele anda com as próprias pernas e fala com a própria boca. O autor foi apenas um designer de seus lábios. Porque tudo o que o poema fala ou silencia, é com sua própria boca. Ele fala com sua própria voz. Já a prosa depende de uma força motriz diária, de uma atividade intermitente que crie caminhos para o desenvolvimento da história. Os personagens dependem disso, o enredo só existe por causa disso. Enfim, foi assim que aconteceu comigo: escrevendo todo dia. E quando não estava escrevendo de fato, estava mentalmente imaginando saídas para meus personagens, à medida que criava outros entraves e obstáculos. Ou seja, era um exercício diário de obsessão.

Algumas figuras são recorrentes na sua produção como poeta e prosador – o poeta que mata/morre, a mulher fatal e o salto agulha. Essas imagens são propositais?
Naturalmente, há conexões entre um texto e outro, entre um livro e outro. Embora sejam histórias independentes, um livro está dentro de outro. O primeiro livro Narciso Para Matar vive dentro do personagem do segundo livro Crônica de um Amor Morto, e este segundo, tangência o terceiro livro A Teoria do Romance na Prática. E isso é estimulante. É como brincar com diferentes dimensões textuais, abrindo buracos (wormholes), ou paredes permeáveis, pelos quais os personagens ou as situações se comuniquem.

“Ganhei muito dinheiro e não escrevi mais nenhuma poesia”. Ser poeta é, necessariamente, padecer, sofrer de alguma maneira?
Não necessariamente. Mas ser poeta, escrever livros de poemas e querer publicar esses livros no Brasil, aí sim é padecer, sofrer de várias maneiras. Costumo dizer que publicar poesia no Brasil é o 13 trabalho de Hércules. É aquele trabalho que nem Hércules se atreveu a fazer, não quis peitar isso não.

A trilogia A Complicada Beleza faz um acerto de contas com a Curitiba antropófaga. A cidade é uma mãe gentil ou estaria mais para Saturno?
A cidade é uma musa com cinto de castidade. Ela usa um cinto que ela mesma fechou e jogou fora a chave. E dependendo do humor em que ela se encontra, ela insinua, seduz e ilude. Você pode até achar que um dia será acolhido entre seus favores, às vezes pode até quase sentir suas carícias, mas nunca vai inaugurar o beijo ou mesmo consumar o ato. Isso porque Curitiba é uma cidade que cria e favorece os masturbadores. Mas na real, é uma cidade que jamais vai fazer amor com você…

Narciso Para Matar e A Teoria do Romance na Prática brincam com o cinema e imagem na literatura. Como as outras artes podem convergir para a literatura?
Desde o começo de minhas leituras, percebi (o que é obvio pra todo mundo menos para os professores de literatura) que as artes se comunicam, interagem, se orientam e se alimentam. Cinema, pintura, escultura, HQ, música, dança etc, uma arte estimula a outra. Negar isso ou não perceber essa riqueza é cegar os olhos e ouvidos para a amplidão. Não dá pra perder tempo nessa vida seguindo processos analíticos assépticos e estéreis. Há muito conquistamos o direito de criar sem rédeas e amarras.

Por falar em cinema, Narciso Para Matar, Crônica de um Amor Morto e A Teoria do Romance na Prática são seus livros que mais lidam com imagens, principalmente as do dia a dia – embora sua poesia sempre estivesse ligada ao cotidiano. Gostaria que você falasse sobre a importância do cotidiano no seu trabalho.
Acho que este é o lugar que eu vivo. Infelizmente não consigo habitar outros planos, viver em outros mundos, não importa o quanto minhas distrações sejam recorrentes. Os mais belos e atraentes déficits de atenção que me desculpem, mas ainda tenho que viver nessa realidade, nesse cotidiano (risos).

Durante a trilogia você faz várias associações a Edgar Allan Poe. Assim como você, ele subverteu gêneros e caminhou entre a poesia e a ficção. Por que evocar a imagem de Poe?
Sou um admirador de Poe, do homem e da obra. E acho que ele representa com eficácia e de forma envolvente e comovente a figura do artista genuíno, daquele artista que pena nessa vida, tendo que lidar com diversos obstáculos (e desgraças até), e de forma angustiada tendo que conviver com a falsidade do meio literário, a inveja de seus pares, tudo com o propósito vital, puro e honesto de viver e escrever sob o signo daquela qualidade inextinguível – a decência.

Seus livros anteriores formaram a trilogia Um Poeta Deve Morrer e no livro que encerra a tríade mais recente você parece ter matado o Koproski-poeta. Dessa situação seguem duas interpretações. A primeira, é de que esse é seu adeus à poesia, já que enveredou pelos bosques da ficção. A outra é de que para o poeta ser lembrado é preciso morrer. Algo faz sentido nesse pensamento?
Talvez eu já tenha planejado o meu suicídio autoral há muito tempo. Como bem disse o Felipe K, professor de literatura da UFRJ, “Depois da trilogia Um Poeta Deve Morrer, Fernando Koproski simplesmente morreu”. E se pensarmos bem, a melhor coisa que pode acontecer com um poeta é isso mesmo: morrer. Um exemplo: em Curitiba, somente depois que se morre, é que se começam a ler os livros de um autor (risos). Enquanto está vivo, a cidade se esforça por ignorar a presença do poeta de todas as formas. Parece que há mesmo um esforço coletivo pra que isso aconteça: jornalistas, outros escritores, colegas poetas, educadores, professores de literatura, livreiros, formadores de opinião e o grande público leitor – todos sem exceção precisam contribuir avidamente para dissuadir o poeta de trilhar esse caminho, o da arte genuína. Agora se você é um picareta, um embuste, uma farsa que vive de aprovar projetos no mecenato da cidade, superfaturando orçamentos de livros para garantir a sua vida confortável e aquele passeiozinho pela Europa no final do ano, aí sim você encontra espaço pra progredir. A esses farsantes a cidade oferece várias oportunidades. Basta estar disponível… Enfim, diante dessas opções o melhor mesmo é morrer. Sob a ótica do crítico de literatura General Custer, “poeta bom é poeta morto”.

Outro ponto interessante: você é também personagem. Qual o limite entre a ficção e a vida real?
Não há limites, por isso comecei a escrever ficção.

N’A Complicada Beleza você flerta com diversos gêneros literários, do thriller ao romance. Você ainda acredita na literatura dentro de rótulos?
Definitivamente, não. O trabalho criativo só tem a ganhar com a dissolução das fronteiras. Penso num poema tão aceso e livre quanto o sol dentro dos olhos do girassol. Por que fechar os ouvidos a isso? Até quando vamos amputar nossa percepção? Somos muito mais que isso. Sentimos mais alto e mais longe do que imaginamos. Diante do mar e seus movimentos, somos todos aprendizes, alunos, belas e possíveis descendências. Ainda acredito que um dia a inevitável beleza vai nos redimir de toda a gagueira, hesitação e imperfeições de nosso canto.

http://www.aescotilha.com.br/literatura/ponto-virgula/medo-e-delirio-em-curitiba/

A COMPLICADA BELEZA:
http://www.livrariascuritiba.com.br/narciso-para-matar-aut-paranaense-lv395563/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/cronica-de-um-amor-morto-aut-paranaense-lv395564/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/teoria-do-romance-na-pratica-a-aut-paranaense-lv395565/p
Não posso andar que já começo a pensar. Isso sempre acontecia comigo quando andava pela XV. Passava meia-hora andando de casa até a universidade e não via ninguém. Muitas vezes um conhecido dizia depois que havia me cumprimentado, mas eu nem respondia. O pior é que era verdade, sempre fui distraído. Me distraía a cada momento que passava no calçadão. Às vezes porque estava simplesmente olhando uma cena, às vezes porque estava escrevendo de cabeça um poema, mas nem sempre eu pensava em poesia, nem sempre eu escrevia. Muitas vezes era só a poeira girando dentro da minha cabeça, provocando algum pensamento afogado na inércia daquele mar de neurônios condenados à neura da repetição... Como eu disse, muitas vezes era só a poeira girando dentro da minha cabeça, se levantando, pairando e depois lentamente se assentando novamente.
Mas se nessa hora em que as micropartículas de pó levitassem, de repente abrisse uma réstia de luz na minha cabeça, e uma lasca de sol entrasse sem ser convidada, eu já sabia: era poesia. Por um instante, eu podia até pensar que era uma epifania, tipo um acúmulo de nuvens douradas guardadas no fundo do crânio, mas no íntimo eu sabia que isso jamais existiria, ou se existisse, francamente não resistiria. Porque no fundo da cabeça era simplesmente poeira, dourada ou não, mas ainda poeira e talvez o início de uma poesia.
De qualquer forma, sempre que isso acontecia entrava num impasse: ou escrevia o que me vinha ou ignorava a magia. Mas você já fez isso algum dia, você já ignorou a poesia?
O dia em que ignorei a poesia: 21 de maio.
Sim, ela estava comigo naquele dia. Seis da tarde. Ela tinha acabado de sair da aula de dança flamenca. Suas pernas brancas mal se continham dentro da meia-calça roxa. Os sapatinhos de boneca realçavam ainda mais a delicadeza dos pés. A sainha preta ficava agitada diante de minha presença e se rebelava ao vento, inaugurando belezas imprevistas na linha de cintura que a suavidade de seus gestos não compreendia, só intuía entre os seus passos de quase dança e os canteiros improvisados de pétalas de ipês amarelos caídas ao chão.
Maria tinha 26, um pai alcóolatra, uma mãe doente, um irmão carente e uma série de tios e tias ausentes. Ela cursava a Belas Artes, queria ser pianista, tocava desde os quatro anos. A dança era mais uma transpiração do que uma ocupação. Era como a poesia pra mim: um suor da alma. Era algo tão natural e certo e irremediável que parecia não exigir dela nenhuma espécie de esforço para acontecer. Ela dançava não porque ambicionava isso, mas porque a dança era simplesmente sua moradia nas coisas que ela sabia e seu caminho para tudo que ela desconhecia. Sim, quando vinha na minha direção naquele fim de tarde, ela dançava pra mim belezas imprescindíveis de jasmim.
Mas a caminhonete importada avançou o sinal naquele instante. Poderia ter sido um minuto depois ou um minuto antes. Mas não. Tinha que ser naquela hora em que ela se virou pra sorrir pra mim, anunciando com os olhos verdes o seu abraço de jasmim. A caminhonete prensou seu corpo frágil violentamente contra o poste, esmagando pétalas de ipês, e roubando de mim para sempre aquele abraço delicado.
Era seis da tarde quando meu mundo caiu. Sem boleros de Maysa, sem falsa poesia, sem chance de chegar à enfermaria.

Agora vocês já sabem porque estou aqui, porque peguei um ônibus em São José dos Pinhais há quarenta minutos atrás, porque passei pelo Guadalupe mais uma vez, porque não fui direto pra reitoria, porque andei vinte quadras no calçadão da XV pra comprar aquela pistola na Cruz Machado. Por causa disso: um poeta deve morrer, mas antes um poeta deve matar. Sim, um poeta deve matar.

Fernando Koproski
do romance CRÔNICA DE UM AMOR MORTO

http://www.livrariascuritiba.com.br/cronica-de-um-amor-morto-aut-paranaense-lv395564/p
COMO É MAIS FÁCIL TE AMAR

Eu tenho ódio do amor
O amor arrancou a minha insígnia
O amor ainda insiste que eu o siga
O amor deu com os dentes na língua

Eu tenho ódio do amor
O amor me fez desapontar aquela menina
O amor deixou ela toda pontiaguda
O amor arruinou a minha ruína

Eu tenho ódio do amor
O amor deixou poetas com a pele dura
O amor me rebaixou de posto
O amor dava as caras, agora é só um rosto

Eu tenho ódio do amor
O amor me arruma cada uma
O amor é a minha runa, a minha ruína,
A minha mulher de rua e a minha menina

Eu tenho ódio do amor
Que me faz escrever poemas pra você
Mas não me dá coragem de dizer:
O quanto eu odiei te odiar,

E como é mais fácil te amar

Fernando Koproski
no livro “A TEORIA DO ROMANCE NA PRÁTICA” (série de ficção A complicada beleza)
http://www.livrariascuritiba.com.br/teoria-do-romance-na-pratica-a-aut-paranaense-lv395565/p 
NARCISO PARA MATAR (série de ficção A complicada beleza)
http://www.livrariascuritiba.com.br/narciso-para-matar-aut-paranaense-lv395563/p
CRÔNICA DE UM AMOR MORTO (série de ficção A complicada beleza)
http://www.livrariascuritiba.com.br/cronica-de-um-amor-morto-aut-paranaense-lv395564/p
MALDITO DEUS ARRANCANDO ESSES POEMAS DE MINHA CABEÇA (antologia poética de CHARLES BUKOWSKI)
http://www.livrariascuritiba.com.br/maldito-deus-arrancando-esses-poemas-de-minha-cabeca-aut-paranaense-lv386681/p
AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA (antologia poética de CHARLES BUKOWSKI)
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p
ESSA LOUCURA ROUBADA QUE NÃO DESEJO A NINGUÉM A NÃO SER A MIM MESMO AMÉM (antologia poética de CHARLES BUKOWSKI)
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
ATRÁS DAS LINHAS INIMIGAS DE MEU AMOR” (antologia poética de LEONARD COHEN)
http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inimigas-de-meu-amor-aut-parana-lv220048/p
Outros livros do Fernando Koproski são:
RETRATO DO ARTISTA QUANDO PRIMAVERA
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p
RETRATO DO AMOR QUANDO VERÃO, OUTONO E INVERNO
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p
NUNCA SEREMOS TÃO FELIZES COMO AGORA
http://www.livrariascuritiba.com.br/nunca-seremos-tao-felizes-como-agora-7-letras-lv244140/p
TUDO QUE NÃO SEI SOBRE O AMOR
http://www.livrariascuritiba.com.br/tudo-que-nao-sei-sobre-o-amor-aut-paranaense-lv181720/p

e aqui, há 4 CDs meus disponíveis para ouvir e baixar:
https://fernandokoproski.bandcamp.com/

sexta-feira, 24 de junho de 2016

LARA

Lara, vê se não repara
    Mas coração quando machuca
Nunca mais Sara
    Coração que é coração
Mente só para sua mente, nunca para
    Outro coração

Lara, vê se não repara
    Nos meus versos imperfeitos
Quando te vejo uma luz se alastra
    Por meus versos
E dá pra ver na cara
    Quando você solta os cabelos pra trás
O tempo para

Lara, vê se não repara
    Nas pontas ásperas de meu amor
Simplesmente as apara
    Junto com todo meu passado
Mas não olha pro lado
    À procura de uma rima rara

Lara, vê se não compara
    Meu amor com o de outros homens
O blues que chove em meu coração
    Tem o teu nome
Lara, Lara, Lara
    O teu nome já é o refrão
E o resto é canção

Lara ra ra, ra ra ra
    ra ra ra, ra ra ra
Lara ra ra, ra ra ra
    ra ra ra, ra ra ra

Fernando Koproski
no livro NARCISO PARA MATAR
http://www.livrariascuritiba.com.br/narciso-para-matar-aut-paranaense-lv395563/p

terça-feira, 21 de junho de 2016

São gorilas e crocodilos nos Estados Unidos, elefantes no Vietnã ou onças em “cerimônias olímpicas” no Brasil... Só muda o bicho, mas a barbárie é a mesma. Assim caminha a desumanidade...

OS ELEFANTES DO VIETNÃ

no início eles costumavam, ele me disse,
metralhar e bombardear os elefantes,
dava pra você ouvir seus gritos acima de todos os barulhos;
mas para bombardear as pessoas se voava alto,
você nunca as via,
apenas um pequeno clarão lá de cima
mas com os elefantes
você podia ver acontecer
e ouvir o jeito que eles gritavam;
eu falava para meus camaradas, escutem, vocês
parem com isso,
mas eles só davam risada
enquanto os elefantes se espalhavam
levantando suas trombas (se elas já não estivessem arrancadas)
abrindo totalmente
a boca e
cambaleando em suas pernas tontas e desajeitadas
enquanto o sangue escorria de grandes buracos em suas barrigas.

aí voávamos de volta,
missão cumprida.
acertamos tudo:
comboios, arsenais, pontes, pessoas, elefantes e
tudo mais.

depois ele me disse, eu
me sentia mal pelos
elefantes.

Charles Bukowski
traduzido por Fernando Koproski
no livro MALDITO DEUS ARRANCANDO ESSES POEMAS DE MINHA CABEÇA (7Letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/maldito-deus-arrancando-esses-poemas-de-minha-cabeca-aut-paranaense-lv386681/p
AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p
ESSA LOUCURA ROUBADA QUE NÃO DESEJO A NINGUÉM A NÃO SER A MIM MESMO AMÉM
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
ATRÁS DAS LINHAS INIMIGAS DE MEU AMOR” (antologia poética de Leonard Cohen)
http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inimigas-de-meu-amor-aut-parana-lv220048/p

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Antes de falar de Morella, preciso falar de Reynaldo. Ele foi meu primeiro amigo. Reynaldo era um talento nato, escrevia contos, compunha músicas, traduzia uma biografia de Joyce e era um ótimo cozinheiro. Apenas um desses atributos já seria suficiente para lhe dar uma renda substancial e fornecer uma carreira promissora. Mas Reynaldo não atuava em nenhuma delas profissionalmente. Na verdade, ele ganhava a vida graças à vagabundagem dos outros estudantes que não estavam aptos ou simplesmente não queriam fazer seus trabalhos universitários.
Reynaldo realmente supria uma carência do mercado: ele fazia e vendia resenhas, pesquisas, ensaios, estudos críticos, monografias e dissertações para alunos vagabundos. E isso era bem rentável, talvez até mais que uma carreira de músico, escritor, tradutor ou de chef de cozinha. Segundo o próprio, esta profissão ilícita propiciava uma carreira promissora também, pois, convenhamos, o que mais havia na Federal, Puc e nas outras faculdades de Curitiba eram alunos vagabundos, sem a menor vontade de estudar e redigir ensaios e monografias.
Foi assim que o conheci, negociando o preço de uma resenha do livro A paixão segundo G.H. para uma aluna de letras. Na época, eu era fã de Clarice Lispector e tinha uma pequena quedinha por Morella, tanto que me dispus a fazer a resenha pra ela de graça, depois que ela me confidenciou o absurdo que eram os custos dos préstimos literários de Reynaldo.

Fernando Koproski
do romance CRÔNICA DE UM AMOR MORTO
http://www.livrariascuritiba.com.br/cronica-de-um-amor-morto-aut-paranaense-lv395564/p

sexta-feira, 10 de junho de 2016

UM LUGAR AO SOL

você pode até achar que não é verídico
mas aquele meu livro do Érico Veríssimo
Um Lugar ao Sol está todo mofado

você pode até achar que me enganei
mas aquele meu livro do Ernest Hemingway
O Sol Também se Levanta anda bem cabisbaixo

você pode até achar que só me iludi
mas aquele meu livro da Harper Lee
O Sol é Para todos está todo desbotado

você pode até achar que já morri
ou que entrei num eclipse, numa outra elipse
ou qualquer outro diz que me diz que

mas desde o título, a nossa história, amor,
não foi escrita pra ser vivida por um só:
O Sol é Para Todos Ainda Terá Um Lugar ao Sol

Fernando Koproski
do livro A TEORIA DO ROMANCE NA PRÁTICA
http://www.livrariascuritiba.com.br/teoria-do-romance-na-pratica-a-aut-paranaense-lv395565/p

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Como vocês notaram, essa foi a última vez que eu morri. Mas nem de longe essa foi a primeira vez. Já morri várias vezes. E nem sempre foi uma morte útil como esta última.
    A primeira vez que eu morri: era março de 1991. Tinha acabado de entrar na universidade. Tinha dezoito, as mãos macias, olhos de terra molhada e os cabelos também castanhos, cabelos curtos mal disfarçando a ingenuidade da terra molhada, tanto apta a ser perfumada depois da chuva, quanto passível de cair na lama facilmente.
    Era engenharia o que meus pais queriam que eu fizesse e era engenharia o que eu estava fazendo. Sempre tive inclinação pra matemática e portanto toda aquela infinidade de cálculos diferencial e integral me fascinava, dava a prova real de que eu era filho de meu pai, também engenheiro e formado nessa mesma faculdade.
    Mas as coisas para meu pai tinham sido diferentes. A infância pobre naquela cidadezinha de terra vermelha lá do norte do Paraná não só deixou marcas e calos em suas mãos, mas também encardia de terra vermelha sua memória cada vez que falava do passado. A terra vermelha pra quem não sabe, não só encarde tudo que você veste, seja branco ou não. A terra vermelha gruda na roupa, gruda na pele como uma ferida aberta que nunca forma casca. Ou se forma, logo nos lembra da verdade mais uma vez quando a ferida se corta e rasga novamente, revelando o vermelho da carne, vermelho da terra que a gente tem debaixo da pele.
    E é nessa terra vermelha que nós plantamos e cultivamos nossos mortos. Meu vô foi o primeiro a ser enterrado a sete palmos abaixo da pele, depois foi minha avó. E depois a minha outra avó, e por fim meu outro vô. Sinto os quatro dentro de mim. Sei que tenho um pouco de cada um deles e um tanto de terra vermelha correndo em minhas veias.
    Acho que é isso que me faz ser impulsivo, não aguentar ouvir muita besteira. A cada vez que encontro um empenho, uma pessoa que bate de frente ou qualquer espécie de enrosco, não consigo disfarçar nem dissimular. Imprudência ou tendência à inadequação, só sei que acabo abrindo a boca, e mostrando à flor da pele o vermelho de que sou feito.
    Mas tudo isso caiu por terra quando conheci Scarlett. Scarlett foi o meu primeiro amor e a primeira vez que eu morri.

Fernando Koproski
do romance CRÔNICA DE UM AMOR MORTO
http://www.livrariascuritiba.com.br/cronica-de-um-amor-morto-aut-paranaense-lv395564/p
– Penso em escrever um romance com essa dedicatória: “para todas as musas que nunca souberam que foram musas”.
– Mas você tem uma história pra escrever?
– Não. Acho que não. Nem sei se sou romancista. Provavelmente, não. Mas quero escrever um romance. Acho que foi assim com outros escritores também. Acho que eles nunca pensaram em escrever um romance, simplesmente escreveram. Assim mesmo, foram simplesmente jogando na página uma palavra depois da outra, como a colher de açúcar nesse café, uma depois da outra.
– Úúúúii, muito açucarado isso! Você está sentimental hoje, não? Só falta dizer que vai escrever isso sem planejar, sem pensar numa história, sem fazer um plano da obra. Apenas escrever e ver no que vai dar. Mas até quando? Até a hora que não der mais?
– É, mais ou menos assim, agora vou escrever só por escrever. Não penso mais em publicar mais nada. Só quero escrever sem pensar nas ideias do editor, nas tendências estilísticas da “nova” literatura apontadas na última antologia da geração x ou y, ou no que os críticos estão ruminando, ou no que os suplementos literários estão diluindo, muito menos nos expoentes da “nova” literatura brasileira que estão sendo premiados e despontando nos concursos literários. Nada disso. Que se foda tudo isso. Isso tudo nunca teve, e nunca vai ter nada a ver com a literatura. Só quero escrever, Maria. Botar açúcar na minha amargura até a vida azedar tudo de vez, até a hora que não der mais.
– ...

Fernando Koproski
no livro NARCISO PARA MATAR
http://www.livrariascuritiba.com.br/narciso-para-matar-aut-paranaense-lv395563/p