quinta-feira, 20 de agosto de 2015

RETRATO DO ARTISTA QUANDO PRIMAVERA

é agosto
e quando percebo
as pétalas dos ipês já estão caindo

sei que para os outros
o esplêndido é imperceptível

sei que para mim
toda beleza é insustentável
em minhas flores
as pétalas são feitas de pus

sei que nós desmerecemos
as floradas dos ipês
os dedos da tarde
em suas mechas de luz

desmerecemos qualquer
alto das árvores

pois o alto das árvores
se afasta o quanto pode
do chão
e da gente

mas fui muito ingênuo

eu era míope à suprema
audácia da dor
a de doer em mim uma dor
que não possa ser doada,

dor que não possa ser
transformada

pois o outono não é estação
que possa ser primaverada

não sabia que ao teu lado, dor,
o que eu poderia ter era inverno,
inverno e mais nada

assim minha juventude
foi toda intoxicada
pela ideia de beleza

procurei a beleza na paisagem
que me passava

sim, procurei o amor, a beleza,
mas não como a luz pelos ipês
ou como os ipês pela luz

apenas procurei
entre as folhas

e por onde a luz entrou
por onde a luz me rasgou a pele
saíram pétalas de pus

a fim de me preparar
para os invernos da verdade

eu tentei

mas toda beleza que eu tocava
eu ulcerava de suavidades

Fernando Koproski
poema do livro “Retrato do artista quando primavera” (7Letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p

aqui, o "Retrato do amor quando verão, outono e inverno"
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p
aqui, o "Nunca seremos tão felizes como agora"
http://www.livrariascuritiba.com.br/nunca-seremos-tao-felizes-como-agora-7-letras-lv244140/p
já aqui, o "Tudo que não sei sobre o amor"
http://www.livrariascuritiba.com.br/tudo-que-nao-sei-sobre-o-amor-aut-paranaense-lv181720/p

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

A ÚLTIMA NOITE DO MUNDO

esta é a última noite do mundo
não há mais tempo para ser
superficial em amores profundos
tarde demais para se atirar
de ponta em corações rasos

esta é a última noite do mundo
só quero beber o vinho negro
de um milhão e meio
de rosas negras
das noites de teus cabelos

e mirar o mar de mármore
escoando em redemoinho
pelo seu umbigo
até que toda a tua pele
escorra e afogue comigo

esta é a última noite do mundo
o que ontem não era
o que nunca foi amor agora foi-se
deixando só o amor
como nossa última noite

Fernando Koproski
do livro “Retrato do artista quando primavera” (7Letras)

http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p

Esse poema do velho Buk é realmente bem inspirador. Ele já foi usado pelo Bent Hamer na cena final do filme FACTOTUM. E além da propaganda da SHELL, ele também serviu de inspiração para mais um filme do holandês Willem Martinot que eu posto aqui. Poema bom é assim, não se contenta com a página de papel, está sempre procurando outros espaços para habitar e arejar... Pra quem quiser conferir, o poema se chama "Jogue os dados" e eu traduzi ele no livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA (7Letras). O livro está aqui:http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-d…/p
E aqui os primeiros versos do poema...

JOGUE OS DADOS

se você for tentar, vá até o
fim.
caso contrário, nem comece.
se você for tentar, vá até o
fim.

isso pode significar perder namoradas,
esposas, parentes, empregos e
talvez sua sanidade.
vá até o fim.
isso pode significar não comer por 3 ou
4 dias.

isso pode significar congelar num
banco de parque.
isso pode significar prisão,
isso pode significar descaso,
gozação,
solidão.
solidão é uma dádiva,
todo o resto é uma prova de sua
perseverança, do
quanto você realmente quer
fazer isso.
e você irá fazer
apesar da rejeição e das
piores probabilidades
e será melhor do que
qualquer outra coisa
que você possa imaginar.
...

Fragmento do poema de Charles Bukowski
Tradução: Fernando Koproski
do livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA (7 Letras)

http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inimigas-de-meu-amor-aut-parana-lv220048/p
https://www.youtube.com/watch?v=k6_QUhUPrF4

Directed, filmed and edited by Willem Martinot Based on "roll the dice" by Charles Bukowski Voice: Tom O'Bedlam Music: Tony Anderson Shot in Andalusia,...
YOUTUBE.COM


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Muitos já viram e já sabem. Outros, desconfiam. E estão certos! Realmente, o comercial da Shell na tevê é baseado no poema do Bukowski que eu traduzi no livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA. O poema se chama "Jogue os dados" e teve seus versos adaptados pelos publicitários. O poema inteiro está aqui:http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-d…/p
BUK na tevê parte 2. 

Taí a propaganda da Shell com o poema "Jogue os dados" do Bukowski, que traduzi no livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-d…/p

Força, inspiração, persistência. Esse é o dia a dia de milhares de pessoas que, como você, estão sempre em movimento. É por isso que a Shell investe em produ...

YOUTUBE.COM

sexta-feira, 31 de julho de 2015

o amigo Jonatan Silva sacou esse click da manga. 2 BUKS na vitrine da Livrarias Curitiba do Shopping Curitiba. Valeu pela foto, Jony!
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p
e o leo cohen aqui:
http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inimigas-de-meu-amor-aut-parana-lv220048/p

terça-feira, 28 de julho de 2015

Sobre peixes pequenos e Oceanos

Um amigo me perguntou, “Fernando, como vc se sente sendo um dos poetas concorrentes ao prêmio OCEANOS?” Eu falei: “Como um poeta fora d’água...” rsrs... E é verdade. Nunca me senti à vontade em competições e concursos. Sempre achei idiota essa ideia de chegar em primeiro lugar (embora algumas vezes aconteceu de eu chegar...). Possivelmente, foi por isso que larguei a natação quando era pequeno, e desisti da sinuca na idade adulta. A ideia de competir, de objetivar uma medalha ou um troféu, partindo da premissa de que devo subjugar o outro (e fazê-lo se sentir diminuído) sempre me pareceu estúpida e uma verdadeira indecência. Afinal de contas, nunca houve ou haverá melhores, ou mais aptos. Todos somos aptos, embora alguns às vezes se sintam mais à vontade em sua inaptidão. Escrever poesia é isso, se sentir inapto, inadequado, e o tempo todo inconformado seja com a ditadura das formas (e regras e normas) ou com as pré-formatações desagradáveis da realidade. E poetas sempre serão inconformados, indivíduos fatalmente “problemáticos” que apesar disso (ou talvez exatamente por causa disso) têm um sismógrafo ultrassensível aos desajustes e “desconcertos desse mundo”. Daí vem o motivo de eu não acreditar em competições, e em especial as literárias...

Mesmo assim e apesar disso, estou concorrendo com 2 livros ao prêmio Oceanos, os 2 livros de poesia que lancei no ano passado (o “RETRATO DO ARTISTA QUANDO PRIMAVERA” e o “RETRATO DO AMOR QUANDO VERÃO, OUTONO E INVERNO”). E fico feliz por participar dessa festa literária nesse momento, porque neste ano de 2015 completo 20 ANOS DE CARREIRA. São 11 livros autorais, mais 3 livros de tradução (antologias poéticas que organizei e traduzi) e mais algumas dezenas de letras para canções. É um momento de comemoração e estou feliz por ter chego até aqui sem ter concorrido com ninguém, sem querer competir com ninguém (embora em minha cidade há muitos escritores que me odeiam e compitam comigo). Eles querem competir, não há o que os convença do contrário. Já disse que poesia não é uma corrida de 100 metros rasos. Mas muitos ignoram isso e insistem na grande tolice que é a competição literária. Certamente, é por isso que gastam tanto tempo e energia em fechar portas para você (na UFPR, na FCC ou em qualquer outra sigla com pouca Arte e várias Letras...). Mas não estou nem aí pra isso. Continuo fazendo meu trabalho, como disse um crítico “Sem alarde, sendo entre os invisíveis um dos mais conhecidos...”. Adorei essa referência à minha pessoa... rsrs... Sim, sou um homem invisível, assim como se torna invisível todo artista que pretenda trabalhar com arte em Curitiba (Lembram da crônica do Jamil “Como tornar-se invisível em Curitiba”?)

Enfim, invisibilidades à parte, completo 20 anos de carreira, e fico feliz pelos livros publicados, e pelos vários leitores que se tornaram meus amigos (e vice-versa) e sobretudo por todos vocês que de alguma forma, ou em algum momento, ainda dão ouvidos ao que a poesia tem a dizer.

Apesar de eu me sentir muitas vezes inadequado ou enGATAdo (entre um problema e outro ou entre uma coisa e outra), e não ser capaz de expressar no momento certo o quão grato eu sou por ter vocês em minha vida, agora eu digo: Obrigado... Obrigado a todos os profissionais que participaram de meus livros (revisores, designers, capistas, editores). Obrigado a todos os talentosos poetas e escritores com quem eu dividi ou ainda dividirei livros futuros... E principalmente Obrigado por todas as amizades que eu fiz e por todas as pessoas que eu conheci em função dos livros... Essa é a melhor premiação que eu poderia receber... Livro a livro, pensado, sentido e repartido, eu faço de vocês aí do outro lado da página: os meus melhores amigos...

Abraço do ‘peixe pequeno flutuando no Oceano’,
Fernando

ps. Na foto acima do texto, o poeta num típico momento enGATAdo...

http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p

quinta-feira, 23 de julho de 2015

https://www.youtube.com/watch?v=F_1EiVAb_O8
Taí um belo video poema... Traduzi esse poema do velho Buk no livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA. Ele se chama “Então você quer ser escritor?” e aqui ele aparece num belo filme do Willem Martinot. Deixo, de preza, os primeiros versos do poema. Pra quem quiser conferir ele todo, o livro está aqui:
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p

ENTÃO VOCÊ QUER SER ESCRITOR?

se não estiver explodindo em você
apesar de tudo,
não faça.
a não ser que saia espontâneo de seu
coração e de sua mente e de sua boca
e de suas entranhas,
não faça.
se você tiver que passar horas
encarando a tela do computador
ou encurvado sobre sua
máquina de escrever
procurando palavras,
não faça.
se você estiver fazendo isso por dinheiro ou
fama,
não faça.
se você estiver fazendo isso porque deseja
mulheres em sua cama,
não faça.
se você tiver que sentar ali e
reescrever mais uma vez e mais uma vez,
não faça.
se der o maior trabalho só de pensar em fazer,
não faça.
se você estiver tentando escrever como outra
pessoa,
esqueça.
se você tiver que esperar até isso rugir em
você,
então espere com paciência.
se isso nunca rugir em você,
faça outra coisa.
se você tiver que ler primeiro para sua esposa
ou para sua namorada ou para seu namorado
ou para seus pais ou para qualquer um,
você não está pronto.
...
fragmento do poema de Charles Bukowski
tradução: Fernando Koproski
do livro AMOR É TUDO QUE NÓS DISSEMOS QUE NÃO ERA (7Letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p

Um poema para a aniversariante do dia. Os versos traduzem bem o nosso dia a dia. E por falar nos meus dias com ela... Que ela possa ficar ao meu lado assim como eu do lado dela por mais muitos e muitos dias... Um beijo pra vc, Ingrid...

UM ARSENAL DE NUVENS NA CABEÇA

eu um arsenal de nuvens na cabeça
como esse céu
como essa luz dourando
os pelos ao redor do umbigo das nuvens
como essa luz correndo por minhas veias 

a luz correndo por minhas linhas

e botando pressão
em um ou dois sonhos adiados
o fogo desbotado de alguns versos
minha imortalidade com a validade vencida

hoje de tarde
uma página em branco
e esse céu
com uma intimidade
que mais parece intimidação

eu um arsenal de nuvens na cabeça
os teus lábios de avelã no meu gosto ainda
a luz do sol com o púbis das nuvens na ponta da língua

e você
você de novo

com sua pressa de sol as chaves perdidas sapatos desconfiados bolsas indecisas blusas com a cara amassada vestidos com sono perdido espelhos ansiosos cabelos que te desobedecem brincos sem pistas um beijo fora de hora cães à vista sobrancelhas levantadas as notícias mastigadas sem margarina um pão de plástico dois lances de escada e três gatas aflitas

e você
de novo nervosa

você, uma expressão natural da linguagem, sem
metrificação intencional e não sujeita a ritmos regulares

você
toda prosa
na minha poesia

poema: Fernando Koproski
do livro “RETRATO DO ARTISTA QUANDO PRIMAVERA” (7Letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p

terça-feira, 14 de julho de 2015

Meus caros, a nova fornada dos 2 BUKS já está disponível nas lojas das Livrarias Curitiba. Pra quem quiser conferir, está na área:
http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p

quinta-feira, 9 de julho de 2015

A cada dia que passa deus fuma mais compulsivamente. Desde aquela nossa última noite juntos, ele fuma um sol atrás do outro. E assim todo fim de tarde, quando a gente olha para cima, ele aperta o sol sobre nós. Não preciso nem presenciar. Sei que a brasa, quando queima, atira estilhaços de ouro pelas nuvens, deixando-as por um momento inutilmente douradas.

Ingrid, quando você não está aqui, como cigarros amassados num cinzeiro, deus apaga sol a sol os nossos fins de tarde.

Fernando Koproski
do livro “Retrato do amor quando verão, outono e inverno” (7Letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p

Crédito: A foto é do talentoso Daniel Castellano!

quinta-feira, 2 de julho de 2015

É difícil ter um amigo (de verdade) para conversar. Mais difícil ainda é ter um poeta (de verdade) para conversar. E muito mais difícil ainda é ter um amigo e poeta (de verdade) para conversar... E eu tive um, acredite. Por essa e por muitas outras coisas é que você faz tanta falta, Rodrigo... Hoje faz 6 anos que vc partiu e aqui está o poema que fiz na época pra ti e publiquei no meu "Retrato do amor quando verão, outono e inverno (7letras)":

POEMA PARA MEU AMIGO

meu amigo se foi
e levou consigo
mais que um amigo

ele levou a ousadia de fotografar
o silêncio suave e selvagem dos aquários
a coragem de mergulhar fundo
em suas imagens de delírio exato

meu amigo só não foi sensato
ao voltar pra superfície das páginas
a fim de nos fazer respirar
poemas verdadeiros
e toda aquela loucura lúcida de seu romance

meu amigo foi insensato
ao ser generoso
e compartilhar conosco
suas mais puras
e belas anêmonas de sangue

ele foi digno,
ousado, corajoso, verdadeiro e generoso
e como se isso tudo não fosse o bastante
ele também foi um grande poeta
que agora deixou:

toda a poesia brasileira estanque
seis perfurações azuis em meu peito
os livros livres para queimar
fora das estantes

em seus últimos poemas
meu amigo já dava pistas de seu mais novo plano
– fotografar cada um dos aquários
do fundo do oceano –

tanto que no dia 2 de julho de 2009
rodrigo tirou o escafandro do armário
e partiu

para outras águas

para definir essa dor, meu amigo,
tudo que eu não preciso são palavras

(para Rodrigo de Souza Leão)

poema: Fernando Koproski
do livro "Retrato do amor quando verão, outono e inverno (7letras)"

http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p

http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Esta é a entrevista que concedi ao jornalista Matheus Campos, falando sobre poesia e Charles Bukowski:

- Qual era a essência dos poemas e da escrita de Bukowski?
A grosso modo, quando se trata de literatura, a essência é sempre “o que” falar, antes do “como” falar. E o Bukowski sempre teve algo a dizer. É por isso que sua poética encontra tamanha receptividade junto aos leitores. Aqui estamos diante de um autor que tinha muito a dizer e o disse com concisão, beleza e intensidade. Conciliou simplicidade e sofisticação em sua poesia ao tratar de temas universais tais como as dificuldades de relacionamento entre pais e filhos, os reveses no relacionamento entre homens e mulheres, ou a gritante inadequação do homem ao se relacionar com seu próprio tempo, em sua busca desesperada por significação em um mundo cada vez mais prenhe de barbárie e falta de sentido.

- Qual o maior desafio em adaptar seus textos para o português?
O maior desafio nessa prática de tradução foi a singular coloquialidade dos textos. A poesia bukowskiana apresenta uma beleza única ao se servir da coloquialidade. E seria muito fácil traduzir os poemas do Bukowski, apenas se norteando pela coloquialidade sem dar conta de ao mesmo tempo traduzir a beleza da linguagem do original em sua simplicidade. Em outras palavras, é fácil fazer uma tradução “tosca” do original, porque é fácil confundir simplicidade com simplismo. Mais desafiador e recompensador é conciliar no texto em português a simplicidade da linguagem do autor com a beleza de seu discurso e a beleza incomum das imagens poéticas inusitadas que ele utiliza.

- E quais você considera as características mais marcantes de seus textos?
Acho que já respondi essa nas duas anteriores... rsrs...

- O que mais lhe chama a atenção na figura de Bukowski? De vida a escrita.
Talvez seja esta atraente combinação, isto é, a muito bem humorada, comunicativa, lúcida, louca e lírica forma de reescrever sua biografia, ampliando-a, distorcendo-a, e moldando-a em seus trabalhos de poesia e ficção, conforme uma visão de mundo corrosiva e ao mesmo tempo terna, passível de compaixão, ensaiando mesmo nos momentos mais difíceis um humanismo sem igual.

- O senhor também é poeta. O Bukowski é uma das maiores inspirações?
Acho que é uma inspiração contínua, assim como a poesia do Leonard Cohen, onde também pratiquei um trabalho de imersão e tradução (“Atrás das linhas inimigas de meu amor” é o título da antologia poética que organizei e traduzi desse poeta canadense). Mesmo após concluir minhas traduções do Bukowski, continuo envolto por sua poética pois ano após ano sou alimentado por novos livros de poemas (são diversos os livros póstumos), biografias, livros de entrevistas, ou ensaios do autor de modo que desde 2000 (quando comecei a ler e traduzir seus poemas) convivo com ele quase que diariamente. E acho que tem sido uma boa convivência... rsrs...

- O que torna uma poesia boa, em sua opinião?
É tudo aquilo que está além do poema, muitas vezes é aquela sensação, sentimento ou constatação que vem depois da última linha lida no papel. Pois um bom poema tem muito a ver com quem lê. Dependendo de como se lê, o poema cresce, ganha altura, verdade, beleza e prazer sensorial de formas jamais vistas. Compartimentado no papel, o poema pouco pode. Mas livre, solto e saltando aos olhos, fazendo um som na mente do leitor é que ele ganha significação e força, muito além de sua aparente fragilidade. Um bom poema é meio que essa parceria: uma letra em carne viva no papel, intimando uma música na sua cabeça a sonhar ousadias.

Fernando Koproski é poeta, tradutor e letrista. É autor da trilogia "Um poeta deve morrer", composta pelos livros "Nunca seremos tão felizes como agora (7Letras, 2009)", "Retrato do artista quando primavera (7Letras, 2014)", e "Retrato do amor quando verão, outono e inverno (7Letras, 2014)". Como tradutor, organizou e traduziu as antologias poéticas de Charles Bukowski "Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser a mim mesmo amém (7Letras, 2005)" e "Amor é tudo que nós dissemos que não era (7Letras, 2012)", bem como da antologia poética de Leonard Cohen "Atrás das linhas inimigas de meu amor (7Letras, 2007)".



terça-feira, 30 de junho de 2015

Amor é tudo que nós dissemos que não era:

quando li esse verso no original de um certo poema do Buk (love is everything we said it wasn't), senti que o verso tinha aquele "gostinho" que podia dar um bom título de livro... e não é que deu certo?

http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p


http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p

você já pode morrer agora.
você já pode morrer do jeito
que as pessoas deveriam
morrer:
esplêndidas,
vitoriosas,
ouvindo a música,
sendo a música,
rugindo,
rugindo,
rugindo.

fragmento do poema de Charles Bukowski
tradução do Koproski
do livro "Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser a mim mesmo amém" (7Letras)

http://www.livrariascuritiba.com.br/amor-e-tudo-que-nos-dissemos-que-nao-era-autores-lv314864/p

http://www.livrariascuritiba.com.br/essa-loucura-roubada-que-nao-desejo-a-ninguem-a-nao-ser-a-mim-mesmo-amem-7-letras-lv314866/p
AS FLORES EM GREVE DE FOME

enquanto você me fala
que entre nós
as flores em greve de fome
forçada
o sonho ainda com sede
as gatas ainda com sono
a gente na mesma sintonia
da antena da tevê quebrada

enquanto você me fala
que meus poemas são tão necessários
quanto um relógio parado

ainda penso que mesmo parado
o relógio
marca 2 vezes por dia
a hora certa

enquanto você me fala
sobre dias sem piano
da roupa amassada
da casa desarrumada
do sonho de uma vida inteira

das árvores estourando a calçada
da pia enchendo de pratos
ou da chuva há dias
comandando uma verdadeira invasão
através das goteiras

enquanto você me fala
disso tudo

ao invés de lavar a louça
ainda fico aqui lavando palavras
nessa página em branco
encardindo dia após dia essa página
com meus versos

enquanto você me fala
do livro do amor

o evangelho do desejo
se abre à minha frente
e eu

ainda com as mãos
nas coxas pálidas das páginas

leio com os dedos seu rosto
seus braços suas mãos
seus olhos fechados
acesos

leio com a língua seus joelhos
seu umbigo sua nuca
suas pernas
seus tornozelos

leio toda a sua pele

toda a epiderme das páginas
desse livro

que sou eu e você

enquanto você me fala
que entre nós
as flores,

seus dedos brisam
por minhas costas

e uma suavidade impera
sobre todos os segredos

Fernando Koproski
do livro “Retrato do artista quando primavera” (7letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-artista-quando-primavera-7-letras-lv341627/p


sexta-feira, 12 de junho de 2015

POEMA DE AMOR

o amor não tem mesmo coração
o amor não foi quem eu pensei que era
não fui quem o amor pensou que eu fosse
mas o amor estava à minha espera

ah o amor fez o que quis
e o que não quis comigo
se você tem amor no coração
não queira o amor como inimigo

pois o amor não tem fim
o amor dançava em teus lábios
o amor sorria em teus braços
o amor fez sua cabeça contra mim

tava com o amor na ponta da língua
tava com o amor na palma da mão
mas o amor escorre entre os dedos
o amor não tem mesmo coração

o amor agora não me deixa em paz
o amor sempre esteve dentro de você
o amor dessa vez foi longe demais
o amor parece que leu a minha mente

agora o amor só quer saber da gente
mas o amor nunca foi meu forte
o amor é o que te mantém em pé
o amor gosta de viver perigosamente

no coração o amor foi o último a chegar
o amor é sempre o primeiro a sair
o amor parece que deu um nó dentro de nós
agora o amor não tem mais onde ir

Fernando Koproski
do livro “Retrato do artista quando primavera” (7letras)
http://www.livrariascuritiba.com.br/retrato-do-amor-quando-verao-outono-e-inverno-7-letras-lv341626/p

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Dance me to the end of love é uma canção do Leonard Cohen que traduzi como “Dance-me até o fim do amor” no livro ATRÁS DAS LINHAS INIMIGAS DE MEU AMOR. (vc acha ele aqui: http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inim…/p ) E ela está nesse vídeo em que por um Perfume de mulher Al Pacino, dança com aquela velha destreza de quem sente, às cegas, e mesmo assim vê claramente... ou seja, o tipo de coisa que se faz quando se dança até o fim de um amor...

DANCE-ME ATÉ O FIM DO AMOR

Dance-me até a sua beleza
com um violino ardente
Dance-me pelo pânico
até eu estar calmamente
Hasteie-me como a oliveira
e seja meu pombo orientador
Dance-me até o fim do amor

Deixe-me olhar sua beleza
quando não há testemunhas
Sentir o que te movimente
como na Babilônia intuas
Leve-me onde mora com demora
o que eu só sei a se pôr
Dance-me até o fim do amor

Dance-me até a hora do sim
dance-me ininterruptamente
Dance-me por muito tempo
mas dance-me ternamente
Estamos ambos abaixo de nosso amor
e ambos onde acima for
Dance-me até o fim do amor

Dance-me até as crianças
que estão pedindo para nascer
Dance-me pelas cortinas
que o nosso beijo desbotou
Arme uma tenda agora
embora cada fio se soltou
Dance-me até o fim do amor

Dance-me até a sua beleza
com um violino ardente
Dance-me pelo pânico
até eu estar calmamente
Alcance-me de mãos nuas
alcance-me onde sua luva supor
Dance-me até o fim do amor

poema do Leonard Cohen
traduzido por Fernando Koproski
e incluído na antologia poética ATRÁS DAS LINHAS INIMIGAS DE MEU AMOR
http://www.livrariascuritiba.com.br/atras-das-linhas-inim…/p